terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Algumas impressões sobre Urânios

      A leitura de Urânios, de Roberto Muniz Dias, propõe uma experiência instigante a quem se aventurar nessa obra que aborda, entre outras coisas, o poliamor, ou seja, um relacionamento oposto a convencional monogamia. Esse ingrediente, por si só, certamente atraia leitores que possuam alguma relação ou até mesmo um conhecimento efetivo acerca dessa modalidade amorosa.
      Em se tratando de Roberto Muniz Dias, o que se quer narrar nunca se esgota ao lugar comum de qualquer narrativa. A forma em que é contada, importa bem mais e corrobora para o que realmente se quer expressar. Em Urânios, o poliamor não é tematizado para exaltar uma liberdade de amar e sentir imenso prazer. Há os relatos em que o narrador-personagem relembra a forte "química" sexual entre os três envolvidos, numa relação tão intensa quanto misteriosa. Ele relembra também, o conselho de um amigo que avisara: "amor você guarda para quem beija e para o sexo o beijo seria algo estranho." Eis aí um impasse: amor e sexo não podiam ser vivenciados juntamente? Seriam assim, tão diferentes os relacionamentos homoafetivos? A busca por várias respostas é impulsionada por uma forte entrega aos desejos libidinosos. Entretanto, outra questão que se insere seria: um relacionamento, poligâmico ou não, dispõe de uma equivalência afetiva? O que aconteceria se não houvesse confiança? 
      Os relatos de Urânios consistem, literalmente num mergulho de uma alma devastada por um ímpeto de sedução, mas também de geniosidade. Ossos do ofício de um artista? Vide as incursões nas artes plástica (o belo galo colorido) e os poemas que remontam um ultra-romantismo. Almeja-se encontrar um amor, mesmo que pra encontrá-lo, há de adentrarmos por terrenos minados, como a relação supostamente estabelecida, a qual o terceiro (narrador-personagem) enveredou, sob o alerta constante de amigos. Aliás, cabe ressaltar as passagens em que imperam os olhares maledicentes, os comentários maldosos, que ocasionaram num abalo a harmonia do trio. Não que este vivesse em total afinidade, o narrador-personagem estranha o pouco diálogo, o ambiente do casal não contar sequer com livros, nem porta-retratos. E cada nova descoberta, constitue uma perda das referências aprendidas ao longo da vida desse fascinante e melancólico personagem sem nome. 
      Em Urânios sente-se um clima de desolação, pela própria incursão na busca de um sentimento em que não se tem garantias, apenas desejos em comum, buscas em comum e extratégias nada prudentes, nada ocasionais. Parafraseando Machado,são relatos escritos com o teclado da angústia e os dedos da paixão. Entretanto, o caráter melancólico e desesperançoso incide numa preocupação voltada para a própria estética literária. O que é louvável em tempos de aderência a clichês melosos ou vampirescos.



3 comentários:

  1. Eduardo Eulalio sempre me surpreendendo com suas análises e reflexões. Minha gratidão a quem se propõe a ler com o compromisso além-leitor!

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  2. Bela resenha, Eduardo! Parabéns e me empresta o livro!!! rsrs

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  3. Prezado Wesley,
    Se Eduardo não te emprestar, olha ele aqui no site da Editora:http://www.metanoiaeditora.com/loja/products/Ur%E2nios.html

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