domingo, 25 de setembro de 2016

Comentando, Trilogia do Desejo de Roberto Muniz Dias

Trilogia: a versatilidade romanesca
Trilogia do Desejo é a coletânea que agrupa os três primeiros romances do escritor piauiense Roberto Muniz Dias, são eles: Adeus a Aleto, Um buquê improvisado e Urânios. Geralmente, essas obras estão relacionadas a literatura Queer, ou literatura LGBT, uma vez que a temática homoafetiva é recorrente na ficção criada por Roberto Muniz Dias. Entretanto, a leitura atenta de Trilogia do desejo revela inúmeras possibilidades de categorização dessa literatura, ou seja, as estórias não se restringem as aventuras, descobertas das personagens, homossexuais ou não, fatos extraordinários  ou coisas desse gênero, mas importa, sobretudo, nas narrativas de Roberto Muniz, a concatenação das memórias com os recentes “estados d’alma”   dos seus protagonistas. Doravante, uma série de referências são inseridas na narrativa corroborando para o hibridismo do texto, ou seja, mitologia grega, trechos de canções populares, cânones literários, entre outros aspectos, surgem num fluxo de consciência que acentua a incessante busca da “verdade” de seus personagens.
Adeus a Aleto
No romance de estreia de Roberto Muniz Dias, acompanhamos um protagonista, escritor, em sua estadia pela Europa divulgando sua obra, e claro, entregando-se aos encantos e prazeres das noites de Amsterdã, entre vinhos e a companhia de um misterioso jovem chamado Nikov. Quem seria Nikov? Um turbilhão de dúvidas se faz na mente do protagonista. As luzes, os sons, toda uma atmosfera de suspense perpassa nas páginas de Adeus a Aleto. Um escritor dividido entre os prazeres noturnos e a fertilidade da criação literária, eis o dilema do protagonista sem nome de Adeus a Aleto.
Um buquê improvisado:
Talvez seja o romance mais palatável de Roberto Muniz Dias, por conter os ingredientes de uma boa ficção literária, ou seja, dramas, aparente linearidade, personagens cativantes, antagonistas de causar revolta, sobretudo, a problematização do conceito religioso, ou seja, a maneira como o cristianismo serviu de forte influência na construção da personalidade e fomentação da cultura a qual pertencemos: maniqueísta, preconceituosa e preocupada com o ideal heteronormativo. A pungência de Um buquê improvisado é ampla por minar o grupo social que é a família, ou seja, a noção de família é problematizada através das personagens que se veem inseridas enquanto “estrutura tradicional” da sociedade, quando justamente essa noção está sendo posta em cheque pelo protagonista J. em meio sua presente situação e a descoberta de fatos importantes sobre seu pai.
Urânios
Nesse romance, de forte tom intimista, o leitor é apresentado a um “relato de amor e morte, mas nada póstumo porque tudo já estava morto: o amor, o tempo e a identidade.” Este relato trata-se de uma experiência poliafetiva, ou seja, um jovem junta-se a um casal de namorados, numa entrega movida por impulsos sexuais, narrados de forma sublimes, contidas, sem jamais extrapolar para vocabulários pejorativos, uma vez que seu estilo narrativo prima pela sutileza, puro lirismo. Doravante, é problematizada essa modalidade amorosa, através do protagonista de posse da pintura de um galo colorido, herança que insiste em avivar as lembranças do trio amoroso. Disposto em capítulos que se alternam, esse romance aborda, a priori, a construção da identidade do protagonista- o presente e o passado, a gênese, e também corresponde ao retrato fiel da contemporaneidade, no qual os relacionamentos amorosos não mais se restringem às normas do século passado. É o carácter libertário que a boa literatura proporciona. É a Trilogia do desejo dando o grito de liberdade que é desejo de todo indivíduo que se permita pensar e viver com autonomia.