domingo, 24 de maio de 2015

Sobre Tatuagem, o filme

O ator Jesuíta Barbosa em cena de Tatuagem
    Para muitas pessoas, o cinema brasileiro se resume a filmes sobre o mundo cão das favelas, comédias com atores globais, alguns até protagonizam um roteiro feito para um personagem de telenovela que emplacou, por exemplo, o mordomo Crô, de Fina Estampa. Sem falar que a maioria maldam os filmes tupiniquins porque “falam muito palavrão”. Pergunto-me, qual a razão disso? Será um fato ou o público que não procura diversificar, assistir outros que não os exibidos em grande circuito?
       Recentemente revi Tatuagem, filme de Hilton Lacerda, de 2013 e vejo que esse cinema, que não atende aos apelos do comercio, do mainstream sempre  tão apelativo e redundante, representa uma efetivação aliás, valorização da sétima arte em nosso solo. Afirmo, no que tange a ousadia de realizar um projeto consistente, com roteiro enérgico carregado de metalinguagem, onde as cenas ora flertam com o drama (gênero do filme) ora com números teatrais carregados de erotismo, uma transgressão onde no cinema surte a catarse tão necessária à existência. Tatuagem remonta o período ditatorial brasileiro, onde uma trupe teatral, por meio de espetáculos altamente provocativos, combatia esse regime, a censura e a dita moral dos bons costumes, tão apregoada na época, esta representada no filme pela religiosa família de Fininha (Jesuíta Barbosa). Bem, em nossos dias essa mesma moral ainda é usada como arma contra a liberdade das minorias. Nem é preciso recorrer às redes sociais, na TV, em nosso dia a dia os discursos preconceituosos prevalecem sob o manto de uma moral cristã.
       Em Tatuagem, as atuações do par romântico são envolventes de forma magnífica. O conflito da trama proporciona cenas intensas, sensuais que não nos deixa tirar o olho da tela. O romance entre o performático Clécio (Irandhir Santos) e Fininha  incendeia a imaginação: este um jovem servindo o exército, aquele uma “ameaça” à ditadura, logo esse impasse dar a tônica do roteiro, sem falar da inocência de Fininha, a meu ver os “olhinhos infantis” adquire a perfeita personificação em seu personagem. Extrapolando o filme personifica é o ator mesmo...
      O que é evidenciado em Tatuagem é a luta pela liberdade individual, seja num ambiente propício a esse exercício como nos espetáculos da trupe Chão de estrelas, que se vale de discursos irreverentes, poéticos e até filosóficos, mesmo lançando mão do “deboche” como arma maior e em contrapartida, num ambiente contrário à liberdade (o quartel), que ainda assim não consegue negar instintos e seus agentes resguardam-se na clandestinidade, que quase sempre atiça, alimenta a efetivação, a paixão intensa de usufruir da liberdade negada.

  

sábado, 16 de maio de 2015

Geração #eusoacho

     Não. Não adianta dizer que é a falta de tempo que impede as pessoas de pensar. Tempo é a gente que faz. Talvez seja a falsa impressão de que a tecnologia de informação clareia tudo. O fato é que "nunca na história desse país" as pessoas demonstraram tanta incoerência. Quando não demonstram, é porque estão sob os domínios do fanatismo religioso. Este, declaradamente, constitue um verdadeiro limite de pensamento, de delimitação de horizontes, que vai na contramão dos mundanos ultra-liberais, embora em alguns pontos converja para uma mente fechada ou falsamente aberta.
      Muitos fatores corroboram para uma desorientação dos indivíduos. Justamente a tecnologia, tem sua parcela de culpa. Entra-se no Facebook e o que se vê, são o compartilhamento de frases banais com "aspirações filosóficas". Não bastasse isso, algumas tem a infâmia de serem atribuídas a algum cânone literário, quando sabe-se que o indivíduo  nunca leu um romance de Machado de Assis, por exemplo. No entanto ilude-se por uma singela frase prontinha, enlatada: "É isso que eu sinto." Quando na verdade, nada expressa melhor o sentimento, que aquilo que nos dispomos a relatar de punho próprio. São nossos pensamentos, nossos erros (se houver), nossa verdade construida por mãos próprias. Não que o indivíduo deva gostar de literatura, a questão aqui é a falta de aprofundamento em questões humanas que isso aponta, pois a sociedade encontra-se imersa numa falsa sensação de praticidade. Isso, é consequência da ilusão midiática a que são submetidos, aliás, submetem-se, uma vez que não se dispoem a analisar fatos, refletir, não leem. Logo: vítimas de correntes ideológicas, o que acarreta no discurso de ódio (ao homossexual, ao imigrante pobre, ao negro, etc) e propagação de velhos preconceitos, alguns ancorados por uma moral cristã. 
       Certamente, muitos ouviram de amigos estarrecidos os piores temores acerca do beijo gay na novela, certo? Todavia, alguns desses mesmos indivíduos estarrecidos, temerosos, estarão na Parada LGBT demonstrando uma parcela de aceitação, já que sua mentalidade não encontra-se de todo esclarecida, pois ele (a) esculachou o beijo das Senhoras da novela. Também, certamente, deve ser daqueles que, perguntado sobre a adoção de crianças por casais gays, dirá que teme pelo psicológico da criança, o buylling que ela sofrerá. Mas deconfortável mesmo, é o temor dos fanáticos religiosos, evangélicos. Certa feita, ouvi no café da manhã da empresa: - Podem casar. Eu não tenho preconceito. Mas não falem o nome de Deus! Isso não!  Quase que eu me levantei, mas como sempre, fiz a egípcia ou a Sandy, toda certinha e delicada. Queria dizer que eu não era filho de Deus, mas parte do universo e que prezo pela vida, pela benevolência, mas ai a conversa ia tomar rumos bem mais densos, tensos mesmo. Me aquietei. 
       Bom, na verdade soa pessimista constatar esse constrate, ou melhor, essa proliferação de vozes, frases tomadas como verdades incontestáveis. Vejo que o que falta é um aprofundamento, uma busca incessante pelas "verdades" da humanidade. A Educação existe para isso, entretanto, ela virou mercadoria. Não é para todos como diz na Lei, é para quem pode pagar. A Educação Pública há tempos está abandonada pelas autoridades. Estes, com esse "boicote" a educação, corroboram com a geração do #eusoacho.  
       

sábado, 9 de maio de 2015

Tédio?

       Era domingo de tarde, a melhor hora do dia, então, da minha área de serviço eu tinha: o vermelho dos telhados a perder de vista; os barracos da "comunidade" enfeiando São Paulo; a rua vazia, tinha também um casal sentado na calçada, esses, aparentavam está na casa dos cinquenta. Boa idade. Chegarei lá, espero. Mesmo de agora, prometi filtrar um monte de coisas, me aprofundar nas coisas. Poucas, porque o que importa é qualidade, não quantidade. Tudo é ilusório, menos a dor. Até mesmo o amor é ilusão, ou desilusão? Não sei, pois nunca amei.
      Creio que são bem poucas as pessoas descentralisadas, como eu. Que bom né! Estando em completa desvantagem com os outros, prometi fazer  só o que me interessa, de uma forma ou de outra não vou agradar mesmo. Nem de longe lembro a personagem de Almodovar do filme Tudo sobre minha mãe. Não entendo como as pessoas ficam entediadas tão facilmente. Tédio são as redes sociais. Na verdade, eu que esqueço de mim, dai não entendo o tédio dos (nos) outros. O tédio nem pensa em se aproximar de mim, pois logo penso nos "1001 discos para ouvir antes de morrer", também nos livros e filmes... então, ao que parece sou um ser que só ver as coisas, não age, não reage a própria vida. Céus, o que sou?
      O negócio é ter foco, já dizia a professora 13 de literatura inglesa. Dizia também que era pra termos vida fora do campus universitário. Sempre tenho, minha filha. Nessas aulas, comecei a me interessar por Poe, até hoje o único escritor americano que li. Mas é por enquanto. Tudo é por enquanto, enquanto se vive. Isso é Clarice Lispector. E que instantes taciturnos nesse frio outonal. Minha alma congelou. A inspiração debandou também me deixando um vazio e não é fome. Já sei vou fazer daimoku, meu alimento necessário pra continuar... o quê mesmo? Ah sim, a ser engolido por essa cidade, pelo tempo, o dono de tudo e única coisa que existe. O resto é ilusão, inclusive as coisas das quais gostamos-gastamos dinheiro e TEMPO são ilusórias. "Parem esse mundo que eu quero descer/ tudo é dinheiro o amor pra onde vai?" Descer pra onde Vanessa da Mata? Brincadeira, Passarinha, sua música é ótima pra pensar o mundo. Ai, essas músicas que me vem do nada... ,assim como as múltiplas vozes aparentemente perdidas no TEMPO que me acham novamente...

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Ovinho de Amendoim


     Vagarosamente silencioso está agora. Não se sente o tempo passar e sigo o mesmo ritual de décadas. O banho frio já tomado e estamos no outono frio. Mas já na casa dos trinta, prometi viver somente do que for essencial. Os deslumbres já passaram. A beleza do mundo, aquela que é mostrada pelas pessoas em seus atributos físicos ou de estilo, essa, nem me encanta mais. Passei a querer coisas sólidas, firmes. Pudera eu ser a firmeza que procuro nos outros. Sou a firmeza de uma inconstância, de uma imprecisão.
    Acompanhando as notícias que sempre se repetem. A vida sendo cada vez mais bélica à medida que o ser humano avança em conhecimento tecnológico. Que isso tem a ver? Viagens à parte, é porque hoje, o homem urbano globalizado conhece muito bem a sociedade a que pertence. Muito mais até do que quem vive enfiado nos livros. Estes para quê? Devoro livros, extasiados por narrativas poéticas, filosóficas, etc, e apanho por não conhecer as regras para viver na sociedade. De uma doçura sem precedentes o que já cometi de gafes, faria rir a maioria dos seres empíricos, por mais que esses se moldem sob os conteúdos da televisão aberta. Queria mesmo era que meu cérebro se alargasse. Não precisaria passar pelo desconforto de ser quem se é. Mas eis que sou eu, mesmo tendo várias sensações de déjà vu. É inescapável a fuga do próprio destino, pois ele é construido pelas causas desse plano ou de outro anterior. Quanto ao cérebro, clicheramente falando, queria que o lado da razão falasse mais alto. Não é o que me acontece. Que o diga os múltiplos rompantes que me invadem. Ai a voz abafada dá lugar a uma estridência violenta, a falsidade necessária, ou política da boa vizinhança dá lugar ao foda-se!
     Acabara meus cigarros, e há muitos livros ainda plastificados. O café de Dubai estando fresco é bom. O mundo lá fora não me atrai em nada. Cai o peso das míseras conquistas. Mais só isso? Tão pouco cedi à vida, que ela me responde com um vazio maior que o buraco na camada de ozônio. Se olho em volta parece que todos entendem o que é estar vivo. É difícil acreditar que fui adolescente, oh fase de imbecilidade! Passei apenas. É o que faço, passo pela vida sem deixar marcas, saudades... tou é fazendo hora extra. #partiujúpiter. Parece que tenho uma bola de gude, ou ovinho de amendoim no lugar de um cérebro.
     É feriado e eu não queria está na praia, num restaurante, num cinema... em lugar nenhum. Pra quê? Tudo ia acabar mesmo. E quanto mais se vive, mais nos aproximamos da morte. Notívago? Não sou felizmente. O ruim são alguns desvarios oníricos dignos de Alice num país precisando de maravilhas. Cansei de tudo, de mim. Mas tenho de ser ator e desempenhar bem vários papéis. De preferencia de personagens bem secundárias, figurantes, estão bom pra mim. Farto de tomar algumas dores do mundo,  ter que argumentar, suportar ignorância. Farto das pequenas distrações mas, anseio para ver por milhares de décadas o pôr do sol.