sexta-feira, 25 de julho de 2014

Paranóico- Hiperbólico

Ah Clarice! Encorajai-me.
          Há dias que não vejo o menino do ônibus. Será que não trabalha mais no mesmo bairro que eu? Tá cada vez mais difícil parar de pensar nele. Não faço mais nada direito. Fui abduzido por um ser inter-galático que habita em mim e cordena minhas sinapses. Os dias passam, passam lentamente. Tamanho é o peso da insignificância. Mas, vou indo. Lá pra Baixa da égua, que é o lugar dos desgarrados e lunáticos. E velho ainda por cima. Trinta e seis anos nos couros e paixonites adolescentes! Vai se lascar meu!  
          Vou indo. E pra compensar o meu pesar obsessivo acabei sucumbindo a pequenos prazeres destrutivos. Eufemismos à parte, não são nada pequenos. Estão mais pra hiperbólicos. Hoje mesmo, depois de trabalhar incansavelmente, só na intensão , que a noite chegasse logo. É na volta para casa que posso pegar o mesmo ônibus que Ele. Hoje passei o dia à base de café e chá-mate. Copos e mais copos. Outro dia, não aguentei e pedi pra levar a mochila dele, já que consegui sentar no ônibus. Quando ele também consegui sentar ele disse-me: - Amigo, me dê que eu levo, obrigado. E eu não consegui levantar a cabeça. Fiquei todos os tons de vermelho possíveis. As cores de Almodovar e da frida Kahlo ficam apagadas perto do meu embaraço. Nem pra eu ser "tímida e ousada ao mesmo tempo" igual a Clarice Lispector. Esta sim ,me entenderia. 
           Então, já que vai ser um fim-de-semana-de merda, fiz uma pequena extravagância barata: comprei um pacote com dez maços de cigarros; seis sacos de Fofura, aquele salgadinho dos infernos; quatro caixas de chocolates Garoto, já que o Garoto que eu gosto, sabe que lá a que universo pertence. E mais quatro Pepsi de um litro; E quatro cervejas... Em pensar que outro dia ele sentou ao meu lado e eu, num desespero do caralho, comi cinco bombons Lacta em seguida. Ele deve ter pensado: esse tá com fome demais... mas minhas orelhas queimaram. Ele deve ter percebido isso. Ainda falo novamente com ele! Ah se falarei, quando puder! Enquanto não souber, não desistirei de saber qual é a dele. A minha eu sempre soube. Mas tenho focado muito na carreira. Que carreira? A de sobrevivente. Sim, é claro. Mas quero muito ouvir a voz dele. 

domingo, 13 de julho de 2014

O Canarinho Voou

I'm so Brazillian

          Pois é. A Copa acabou, e eu pra variar, encarei esse mês de Copa do mundo como um mês qualquer. Não alterei nada em minha rotina. Não chorei e nem sorri, não senti emoção nenhuma. Embora, tenha adorado sair do trampo mais cedo nos dias em que a Seleção Canarinho, Passarinho ou seja lá o que for jogou. Se é que se possa dizer que jogou, uma vez que o resultado foi decepcionante. Nessas horas que ser um "eu" tem suas vantagens. Vejo somente o lado positivo da derrota do Brasil nessa copa.
          Para mim o melhor da copa foi mesmo perceber o clima de reunião familiar, de euforia, comes e bebes, mesmo que para assistir os jogos e torcer. Mas torcer mesmo! Na correria em que vivemos é raro ter uma ocasião em que a família e amigos se reunam. Exceto aniversários ou natal e reveillon. Na copa, a algazarra é mais intensa, não sei de onde se extrai o tal do patriotismo. Ou melhor, sei sim: é tudo culpa dessa cultura de celebridades que vive de mostrar homens e mulheres talentosos. Claro que também mostram que além do talento, também são humanos: amam, sofrem, adoecem... vieram lá de baixo. Logo a população pobre de espírito se identifica. São aclamado heróis, Deuses do Olimpo. Estão em todos os outdoors ganhando horrores. Mas nem sempre esse jogo de "imagem" funciona, que o diga aquela música tema oficial da copa. Francamente, olha a pretensão: We Are One. Qualquer pessoa que tenha senso, observou que o que menos somos, especialmente de um ano pra cá, é uma só coisa. Nunca o Brasil esteve tão múltiplo como agora. Tão dividido. Tão desigual. E vai ficando cada vez mais, à medida que chegam ao nosso país outras etnias, vindas pelas mais diversas razões. Ou seja, por mais que intentam, há mais razões para não entrar no oba-oba de que aqui é o país do futebol, do que pra  entrar nessa canoa furada. E a música We Are One não decolou mesmo. Nem precisa explicar por que.

          A copa, como todos sabem, trouxe benefícios pra uns e prejuizos a outros. Hotéis, restaurantes lucraram muutíssimo, ao passo que os comerciantes que fecharam os estabelecimentos cedo, nos dias de jogos da Seleção- Canarim- que- deixou- muito- Zé- Povin- revoltadim jogou tiveram perdas enormes. Mas, é como se sabe: crise e oportunidade andam juntas. Sabemos também que esse negócio que o Brasil é o país do futebol é pura balela. O Brasil é o país de tanta , mais tanta coisa que minha mente devagar-quase -parando ainda não fez uma pesquisa pra apurar os números exatos. Nem o PIB eu sei. Só sei que tem muita gente descontente com a situação socio-econômica brasileira. Há de ter que se dar o famoso jeitinho brasileiro, é pra se virar do jeito que a coisa tá. E o Brasil perdeu feio essa copa que foi no Brasil. Brasil que não é o país do futebol coisa nenhuma! O sonho do hexa ficou só no sonho. Bem vindo a realidade Brasil. Como disse, ficarei com o lado positivo da derrota: encarar a realidade. Que é o fato que temos que melhorar é em tudo. Todos sabem o caos que é a saude pública, a educação então... se a seleção tivesse sido a campeã, o clima de Ilha da fantasia ia tomar conta do povo brasileiro. E o mesmo povo depois ia reclamar da saúde, da educação ,da segurança. Só ligam mesmo para o circo midiático que reina: é o país do futebol, do samba, da mulher gostosa, das telenovelas e blá blá blá. 

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Que País é Esse?

 San'tanna: um fiel retrato brasileiro em sua prosa.
        A crítica social nunca esteve tão presente na literatura brasileira como agora. Um exemplo máximo dessa afirmação é o livro O Brasil é Bom, de André Sant'anna. Esta obra é composta por vários contos, onde na maioria o leitor se ver diante de uma polifonia discursiva desenfreada. Os acontecimentos dos últimos anos imediatamente vem à tona, quando o narrador dos contos inscreve uma série de simulações irônicas baseadas em vários pontos de vista preconceituosos. E são realmente vários, diversos, cada conto tem o narrador facilmente identificado com os vários perfis dos brasileiros de agora e do porvir.
       Se o título do livro é O brasil é Bom, Sant'anna, numa ironia dilacerante comprova isso em um dos contos especificamente: O Brasil Não é Ruim. E por que não é ruim? As razões são várias:
 "Deputados, senadores, governadores, prefeitos, vereadores, empresários, sindicalistas, policiais, juízes brasileiros não são criminosos, já que não foram filmados em flagrante recebendo dinheiro, colocando dinheiro na meia, na cueca, na mala-preta. O dinheiro que eles não roubaram na cara de todo mundo, que não foi mostrado na televisão para quem quisesse ver, não era dinheiro público..." (pag. 11)
 "O povo brasileiro não tem orgulho da própria ignorância, não está acometido de um excesso de autoestima..." (pag 12)
Observa-se que a metralhadora verborrágica de Santa'nna, através de um narrador sem nome, utiliza-se de uma palavra de negação: não, para expôr todas as falcatruas políticas e também a falta de dicernimento por uma parcela da população. Aquela que acredita que só porque se é brasileiro consequentemente se é feliz. "Sou brasileiro e não desisto nunca". É o que dizem alguns que nem se quer, tem noção de História do Brasil. Ou caem nas garras de alguma falsa ideologia contentando-se, ou entram no embalo: "Se todos podem, também posso." Ou seja, entrar na onda de consumir qualquer coisa da moda, ao invés de lutar pra garantir direitos básicos. Vale ressaltar, que nesse conto a palavra NÃO aparece sessenta e seis vezes. Isso mesmo, se uma coisa é a não coisa, o Brasil é bom porque ele não é ruim, ora essa!
      O referido conto constitui uma imagem ultra-realista de nossos dias, embora muitos brasileiros vão às ruas protestar por melhorias, é sabido que em meio a um grupo de bem- intencionados, há o dedo de partidos oportunistas almejando tirar vantagem. Ao que parece, a maioria se perde nos meandros da política. Lendo esse texto imediatamente nos vem a mente, as propagandas partidárias mostrando as benfeitorias empregadas e as que estão em andamento. Ou também os partidos se gladiarem: opositores esboçam sorrisos ao mencionarem o que o adversário não fez ou fizeram errado. Se há desorganização, algum político santo vai organizar. Vai. Ah vai. Afinal todos querem o melhor para o povo brasileiro. O que é o melhor? Mais respeito para com a população, que está de saco cheio com toda essa  roubalheira na cara dura!