segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Um buquê improvisado: os inevitáveis espinhos

Um buquê improvisado compõe a trilogia acima.
O romance Um buquê improvisado é o segundo trabalho do escritor piauiense Roberto Muniz Dias. Para quem não conhece a literatura de Roberto, sugiro que comece por Um buquê improvisado, as razões são várias, destaco aqui, a temática do amor, ou melhor, a busca e o desejo de encontrar a plenitude no amor, mesmo quando este é incompreendido, o que acontece geralmente por questões familiares, culturais, religiosas, etc e também, a contemporaneidade da ainda polêmica questão do casamento homoafetivo.
Em Um buquê improvisado entramos na vivência de J. , personagem que após diversas tentativas de libertar-se das convenções e ditames do cristianismo, finalmente retoma as rédeas de sua vida e assume, contraindo um matrimônio com o amor que outrora sucumbia às pressões da moral religiosa. O próprio J. crescera em ambiente caracterizado pelo autoritarismo paterno e pelo singelo carinho e submissão de sua mãe.
Podemos dividir Um buquê improvisado em dois aspectos, primeiramente temos uma narrativa de prazer e posteriormente, uma narrativa de fruição. Constando de vinte capítulos, na primeira metade,  prevalece o cunho da ação das personagens, entrecortadas no entanto, por curtos flashs de memórias de J. que recobra as várias e longínquas tensões por quais passou. Dai, surgem elementos dignos de uma telenovela: paixões, intrigas, ingenuidade, etc. Claro que os diálogos jamais caem na banalização, revelam todo um cuidado com a linguagem, denotando uma prosa poética e sofisticada. Cuja poesia, está inserida, por exemplo, na descrição dos momentos em que J.  masturba-se no banho sob o olhar inquisidor da “esposa de fachada”, que engravidara de J. ,razão maior desse matrimônio, cujo início desse enlace exemplifica a epígrafe desse livro: “ Todas as grandes ações e todos os grandes pensamentos têm um começo ridículo.” A frase do escritor francês Albert Camus, define a incursão de J. ao relacionamento heteronormativo, mesmo este sabendo de sua orientação sexual, de sua homossexualidade.
Após diversos acontecimentos traumáticos na vida do protagonista J. , a narrativa passa a concentrar-se, primordialmente, na busca incessante por sua identidade, uma vez que, um acidente provocara-lhe a perda da memória. Doravante, ele dispõe de várias anotações em um diário, as quais, os registros que descrevem uma vida em segredo, amores imprudentes e certos temores, dúvidas, etc, somados ao silêncio e solidão levaram-no a recobrar em pequenas parcelas o seu “eu”.  Esse doloroso percurso de J. envolto em longínquos registros, “os papéis amarelos”, correspondem à fruição da narrativa. Cabendo ao leitor mergulhar com J. no abismo de sua agora “apagada” existência. Ao passo que a personagem recobra sua identidade, a narrativa retrocede para a infância de J. , da formação de seu caráter, oriunda de sua criação: de um lado um pai severo e ausente, do outro uma mãe doce e apegada as flores e o pequeno J. entre esses dois extremos.
As flores que improvisaram o buquê de J. , constam do momento pós- desilusões e traumas, atestam a superação e a reconquista do verdadeiro amor, que tudo suportou para ocasionar no presente enlace matrimonial. Este, livre de chantagens, angariando apenas o necessário à realização afetiva: a vontade mútua de ambos, que sequer lembraram do elemento de praxe, um simples buquê. Afinal, do quê importaria um buquê, diante das provações que tiveram que passar? Coube aos convidados improvisarem um. Além do mais, as flores que carregam maiores significados nessa obra, são as flores cultivadas pela mãe de J. estas, simbolizam uma vida, embora não durem muito, vivem o bastante pra irradiar frescor e beleza.



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