Um buquê improvisado compõe a trilogia acima. |
O
romance Um buquê improvisado é o segundo trabalho do escritor piauiense Roberto
Muniz Dias. Para quem não conhece a literatura de Roberto, sugiro que comece
por Um buquê improvisado, as razões são várias, destaco aqui, a temática do
amor, ou melhor, a busca e o desejo de encontrar a plenitude no amor, mesmo quando
este é incompreendido, o que acontece geralmente por questões familiares, culturais, religiosas, etc e também, a contemporaneidade da ainda polêmica questão do casamento homoafetivo.
Em
Um buquê improvisado entramos na vivência de J. , personagem que após diversas
tentativas de libertar-se das convenções e ditames do cristianismo, finalmente
retoma as rédeas de sua vida e assume, contraindo um matrimônio com o amor que
outrora sucumbia às pressões da moral religiosa. O próprio J. crescera em
ambiente caracterizado pelo autoritarismo paterno e pelo singelo carinho e
submissão de sua mãe.
Podemos
dividir Um buquê improvisado em dois aspectos, primeiramente temos uma
narrativa de prazer e posteriormente, uma narrativa de fruição. Constando de
vinte capítulos, na primeira metade, prevalece
o cunho da ação das personagens, entrecortadas no entanto, por curtos flashs de
memórias de J. que recobra as várias e longínquas tensões por quais passou.
Dai, surgem elementos dignos de uma telenovela: paixões, intrigas, ingenuidade,
etc. Claro que os diálogos jamais caem na banalização, revelam todo um cuidado
com a linguagem, denotando uma prosa poética e sofisticada. Cuja poesia, está
inserida, por exemplo, na descrição dos momentos em que J. masturba-se no banho sob o olhar inquisidor da
“esposa de fachada”, que engravidara de J. ,razão maior desse matrimônio, cujo
início desse enlace exemplifica a epígrafe desse livro: “ Todas as grandes
ações e todos os grandes pensamentos têm um começo ridículo.” A frase do
escritor francês Albert Camus, define a incursão de J. ao relacionamento heteronormativo,
mesmo este sabendo de sua orientação sexual, de sua homossexualidade.
Após
diversos acontecimentos traumáticos na vida do protagonista J. , a narrativa
passa a concentrar-se, primordialmente, na busca incessante por sua identidade,
uma vez que, um acidente provocara-lhe a perda da memória. Doravante, ele
dispõe de várias anotações em um diário, as quais, os registros que descrevem
uma vida em segredo, amores imprudentes e certos temores, dúvidas, etc, somados
ao silêncio e solidão levaram-no a recobrar em pequenas parcelas o seu “eu”. Esse doloroso percurso de J. envolto em
longínquos registros, “os papéis amarelos”, correspondem à fruição da
narrativa. Cabendo ao leitor mergulhar com J. no abismo de sua agora “apagada”
existência. Ao passo que a personagem recobra sua identidade, a narrativa
retrocede para a infância de J. , da formação de seu caráter, oriunda de sua
criação: de um lado um pai severo e ausente, do outro uma mãe doce e apegada as
flores e o pequeno J. entre esses dois extremos.
As
flores que improvisaram o buquê de J. , constam do momento pós- desilusões e traumas,
atestam a superação e a reconquista do verdadeiro amor, que tudo suportou para
ocasionar no presente enlace matrimonial. Este, livre de chantagens, angariando
apenas o necessário à realização afetiva: a vontade mútua de ambos, que sequer
lembraram do elemento de praxe, um simples buquê. Afinal, do quê importaria um
buquê, diante das provações que tiveram que passar? Coube aos convidados
improvisarem um. Além do mais, as flores que carregam maiores significados
nessa obra, são as flores cultivadas pela mãe de J. estas, simbolizam uma vida,
embora não durem muito, vivem o bastante pra irradiar frescor e beleza.
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