terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Como nossos pais

imagem da cena inicial do filme de Laís Bodanzki
  Como nossos pais é um filme dramático que aborda a difícil situação de uma mulher ao tentar conciliar os vários papeis impostos a ela nos nossos dias. Ser mãe, lidar com os percalços do casamento, abrir mãos dos sonhos profissionais para poder viver do que é possível no presente, ou seja, trabalhar num ramo apenas pelo dinheiro, entre tantos outros desafios é uma tarefa hercúlea.  Some-se a esses fatores uma notícia bombástica acerca de sua paternidade proferida por sua mãe num pleno almoço de domingo! Eis a cena inicial desse drama que já incute no telespectador a vontade de conferir o desenrolar dessa narrativa cinematográfica.
  Com atuações convincentes de Maria Ribeiro e Clarisse Abujamra, mãe e filha nesse longa dirigido por Laís Bodanzky, esse filme abarca uma gama de conflitos de modo bem articulado na narrativa. Não basta Rosa lidar com o fato de sua mãe ter escondido a verdade de sua paternidade por várias décadas, o homem a quem ela o considera seu pai não passa de um fracassado artista a se aproveitar das mulheres por ele conquistadas; a empresa em que Rosa trabalha a demite após uma “cagada” das grandes  onde numa importante reunião ela, atabalhoadamente, apresenta um arquivo contendo uma peça de teatro ao invés do projeto empresarial sobre utensílios de banheiros. Para entornar ainda mais o caldeirão de infortúnios de Rosa, ela desconfia que seu apático marido tem uma amante! Mas não para por ai...
   Este filme tem vários méritos, um deles é a pincelada de humor que vez por outra salta nas frestas desse convincente drama. Nesse núcleo pertencem o pai (artista fracassado) de Rosa e sua meia-irmã, uma adolescente com os hormônios fervilhando em rebeldia – com a cara do século XVI- claro! Além das falas do roteiro serem bem inteligentes. Por exemplo, quando Rosa conta estorinhas para as filhas elas pedem para ouvir a história da Eva, ao menos esse incauto espectador sequer atinou que seria nada menos que a narrativa bíblica e, pra variar, a passagem em que Deus determina um castigo à mulher após ela e Adão terem cometido o pecado. Ao enveredar por esse lado- a mulher sempre oprimida- o longa corre o risco de ser taxado como obra de cunho político feminista, mas isso é apenas um dos modos de categorizar o cinema contemporâneo. O importante é que Como nossos pais não é “dramalhão barato-forçado”, muito menos, mero entretenimento, mas um filme muito bem realizado que não comete firulas visuais, mas foca no roteiro e nas boas atuações do elenco.

  Não bastasse os acertos do filme de Laís Bodanzki já citados, o mesmo ainda traz uma canção da Céu, uma das artistas mais originais da safra de novas cantoras, na trilha sonora. Em suma, é daqueles filmes que prendem a atenção pelo realismo das cenas, sobretudo aquelas que retratam o cotidiano mais banal, por exemplo, nas birras da filha de Rosa, beirando a pré-adolescência. Um teste de paciência que faz qualquer mãe contar até três, respirar fundo pra não perder a linha, mas o instinto materno fala mais alto mesmo, enfim, o máximo que ocorre é Rosa esquecer o leite no fogão. Ops, outro spoiller. Sorry, nada que estrague a experiência de um filme que incute inúmeras reflexões acerca da maternidade, do direito da mulher em ser tão livre quanto o homem e de amor em seu sentido amplo. Nada mal, cinema nacional.

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