imagem da cena inicial do filme de Laís Bodanzki |
Como nossos pais é um
filme dramático que aborda a difícil situação de uma mulher ao tentar conciliar
os vários papeis impostos a ela nos nossos dias. Ser mãe, lidar com os
percalços do casamento, abrir mãos dos sonhos profissionais para poder viver do
que é possível no presente, ou seja, trabalhar num ramo apenas pelo dinheiro,
entre tantos outros desafios é uma tarefa hercúlea. Some-se a esses fatores uma notícia
bombástica acerca de sua paternidade proferida por sua mãe num pleno almoço de
domingo! Eis a cena inicial desse drama que já incute no telespectador a
vontade de conferir o desenrolar dessa narrativa cinematográfica.
Com atuações convincentes de Maria Ribeiro e
Clarisse Abujamra, mãe e filha nesse longa dirigido por Laís Bodanzky, esse
filme abarca uma gama de conflitos de modo bem articulado na narrativa. Não
basta Rosa lidar com o fato de sua mãe ter escondido a verdade de sua
paternidade por várias décadas, o homem a quem ela o considera seu pai não
passa de um fracassado artista a se aproveitar das mulheres por ele
conquistadas; a empresa em que Rosa trabalha a demite após uma “cagada” das
grandes onde numa importante reunião ela,
atabalhoadamente, apresenta um arquivo contendo uma peça de teatro ao invés do
projeto empresarial sobre utensílios de banheiros. Para entornar ainda mais o
caldeirão de infortúnios de Rosa, ela desconfia que seu apático marido tem uma
amante! Mas não para por ai...
Este filme tem vários méritos, um deles é a
pincelada de humor que vez por outra salta nas frestas desse convincente drama.
Nesse núcleo pertencem o pai (artista fracassado) de Rosa e sua meia-irmã, uma
adolescente com os hormônios fervilhando em rebeldia – com a cara do século
XVI- claro! Além das falas do roteiro serem bem inteligentes. Por exemplo,
quando Rosa conta estorinhas para as filhas elas pedem para ouvir a história da
Eva, ao menos esse incauto espectador sequer atinou que seria nada menos que a
narrativa bíblica e, pra variar, a passagem em que Deus determina um castigo à
mulher após ela e Adão terem cometido o pecado. Ao enveredar por esse lado- a
mulher sempre oprimida- o longa corre o risco de ser taxado como obra de cunho
político feminista, mas isso é apenas um dos modos de categorizar o cinema
contemporâneo. O importante é que Como nossos pais não é “dramalhão barato-forçado”, muito menos, mero entretenimento, mas um filme muito bem realizado
que não comete firulas visuais, mas foca no roteiro e nas boas atuações do
elenco.
Não bastasse os acertos do filme de Laís
Bodanzki já citados, o mesmo ainda traz uma canção da Céu, uma das artistas
mais originais da safra de novas cantoras, na trilha sonora. Em suma, é
daqueles filmes que prendem a atenção pelo realismo das cenas, sobretudo aquelas que retratam o cotidiano mais banal, por exemplo, nas birras da filha de
Rosa, beirando a pré-adolescência. Um teste de paciência que faz qualquer mãe
contar até três, respirar fundo pra não perder a linha, mas o instinto materno
fala mais alto mesmo, enfim, o máximo que ocorre é Rosa esquecer o leite no fogão.
Ops, outro spoiller. Sorry, nada que estrague a experiência de um filme que
incute inúmeras reflexões acerca da maternidade, do direito da mulher em ser
tão livre quanto o homem e de amor em seu sentido amplo. Nada mal, cinema nacional.
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