domingo, 6 de abril de 2014

Metido sem eira nem beira

Piauí: Tenho sim, muitas saudades.
       Outro dia, recebi um convite para visitar uma amiga que não via há mais de dez anos. Era dos tempos da escola. Estudamos juntos o colegial todo e ao longo disso, uma bela amizade se fortaleceu. Mas, com o término do ensino médio, vieram as grandes decisões: e agora? o que fazer? Nos rincões do Nordeste, a sina é se aventurar rumo a São Paulo. Foi isso que fizemos. Ela, porque era noivo de um morador de Sampa, eu, há tempos almejava vir a Sampa. Tanto pra trabalhar, quanto por uma vontade doida mesmo.  "E foi um difícil começo"... óbvio. E, voltando ao convite, é claro que fiquei muito feliz. Ao contrário do que dizem, o mundo não é pequeno coisa nenhuma. Em São Paulo então... é uma vastidão oceânica. Pequeno é o tempo que dispomos para dar atenção nossa família, fazer uma leitura ou ter outro lazer, como rever amigos de longa data, entre outros não tão longínquos, que somem nas intempéries do destino.
        No dia do encontro, sai com duas primas rumo a visita especial à antiga colega de classe. Ela, que morava na Zona Sul, nos recebeu com um largo sorriso. A mim, logo exclamou: - Você não mudou nada! Minutos depois dos cumprimentos, ela dispara num misto de inocência e resentimento: - ninguém da nossa sala se formou em médico. O que nos fez cair na risada. Do sertão de onde viemos, é quase raro alguém conseguir estudar medicina. Falei que recentemente, me formei em professor. Ela deu os parabéns. Em seguida, conversamos sobre a vida num lugar que é totalmente o oposto a nossa terrinha. Cada um contou em poucas palavras, a sua vida em Sampa. O trabalho, o bairro, as formas de lazer... , do medo das manifestações violentas ,etc. Enfim, chegou a hora do almoço. Vieram os irmãos de minha amiga e suas respectivas esposas. De novo os cumprimentos. Um dos irmãos repetiu o que minha amiga disse: - O Cadu tá do mesmo jeito. O almoço prosseguiu, encontro de piauienses: galinha caipira no cardápio, é claro. Ao som de forró, sim senhor. Esqueci de contar que no café foi servido um delicioso bolo de polvilho.
        Após o almoço, um dos presentes perguntou a uma das minhas primas: -Você gosta daqui? Ao que ela respondeu negativamente. A outra prima também desafiada: - Não. Mas, é o jeito né. Dos dez presentes, com excesssão da filha pequena, só eu afirmei gostar de São Paulo. Entretanto, não me prolonguei no assunto, deixei a imaginação deles tirar quaisquer conclusões a respeito disso. O fato é que após esse encontro, eu pús me a pensar: - estarei negando minhas origens? Noventa e nove por cento de meus conterrâneos levantam a bandeira piauiense aos quatro ventos. Estão sempre visitando a terrinha nas férias. Postam coisas alusivas ao Piauí nas redes sociais e etc. Eu entretanto... levei até fama de metido! Na verdade, esse rótulo há tempos me puseram. Incompreensão, é claro. Não contei a ninguém como gosto da liberdade, que é andar pelas ruas de São Paulo sem ninguém me conhecer e me julgar. Goza-se de um anonimato totalmente libertador. Não. Não me sinto perdido na vastidão de Sampa. Eu me encontro na plenitude que minha solidão proporciona. Sou eu e o mundo. Nasci só e morrerei só. Há tempos desisti de buscar ser compreendido. Não me basto. Lógico. Entretanto, não quero me limitar a unilateralidade das coisas que sempre ouço e vejo nos outros.

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