domingo, 14 de abril de 2013


O passado, o presente e o futuro em Bisa Bia, Bisa Bel

       O passado é representado na narrativa, logo no início, através de objetos antigos como a caixinha de madeira, os retratos antigos em envelopes de papel pardo e também pelas lembranças da mãe de Isabel ao discorrer sobre um meio de transporte comum da sua época:
      _ A gente ia de bonde, era ótimo, fresquinho, todo aberto. Às vezes tinha um reboque. Quando a gente pagava... (pag. 8) E algumas palavras ditas pela mãe, como motorneiro, intrigavam Isabel. Mas o passado vem à tona mesmo quando Bel encontra um retrato em formato de ovo, de cores marrom e bege, cores que eram denominadas sépias. Na foto via-se uma menininha linda, de cabelo todo cacheado, vestido claro cheio de fitas e rendas. Era a bisavó de Isabel. A Bisa Bia. Que na foto segurava uma boneca de chapéu e algo parecido com um bambolê, um arco, brinquedo da época de Bisa Bia.
        Isabel fica tão encantada com a foto de Bisa Bia, que passa a ouvir sua voz. E o que Bisa Bia fala, na maioria das vezes, são repreensões por Bel, ter modos que na sua época eram inapropriados para uma menina: Usar short, assoviar, subir na goiabeira etc.  Por exemplo:
       _ Ah, menina, não gosto... (pag. 18)
        Desde então as duas começam a conversar sobre as coisas de seu tempo: Bisa Bia, do passado e Bel, do presente. Bisa Bia cita coisas como: móveis antigos (bufê ou etagér),penteadeiras enfeitadas com bibelôs, mosquiteiros, toucador, penico... coisa extintas no tempo de Bel. O que a deixa surpresa com tanta coisa que ela desconhecia. Entretanto, Bisa Bia fica tão chocada quando esta lhe conta das coisas de seu tempo presente. Observa-se um choque entre as coisas, hábitos do tempo de Bisa Bia (século XIX) e do tempo de Bel (século XX). Ao ouvir Bel avisar que vai comer cachorro quente Bisa Bia exclama:
       Deus nos acuda, minha filha! Isso lá é coisa que se coma? Coitadinho do cachorro... Situação semelhante Bel demonstra quando Bisa Bia fala de uma merenda de seu tempo: baba de moça: 
      _ Baba de moça , Isabel, uma delícia!
      _ Ai, que nojo, Bisa, como é que você tinha coragem?
      E o papo explicativo entre as duas continuava. Bisa Bia contando como eram as coisas de seu tempo e repreendendo Bel por seu jeito espontâneo de ser. Ao contrário de outrora, onde as meninas tinham de ser comportadas, quietinhas. O que reflete o modelo de mulher submissa do século XIX e começo do século XX. Logo isso acaba perturbando Bel: a mania de Bisa Bia viver lhe dando conselhos que não funcionam mais. Mudaram-se as maneiras, regras de comportamento no tempo presente que vive Bel.
      Eis que para confundir ainda mais a cabeça de Bel, ela começa a ouvir uma nova voz: a voz de Beta, sua bisneta, que assim como ela, encontrara a foto de sua Bisa: Bel (de short e trancinhas), nas coisas de sua mãe. A voz de Neta Beta contrapõe-se a de Bisa Bia. Ela fala exatamente o que Bisa bel quer ouvir:
        _  faça o que você bem entender... (pag. 30) Ou seja, uma voz do futuro, onde a mulher já tem plena liberdade de agir conforme seus anseios. Vale lembrar, que Neta Beta, que está décadas e décadas à frente de Bisa Bel encontrou sua foto e fez uma holografia delta. E as vozes começam a disputar na cabeça de Bel. Qual voz seguir? A do passado ou a do futuro?
Sendo que Bel, só quer conquistar sua autonomia. E para isso é bom ter a tranquilidade de Bisa Bia, mas também a coragem de Neta Beta.
         Mais que uma simples estória sobre as lembranças de uma menina, através de seus laços familiares e escolares. Bisa Bia, Bisa Bel é um fiel retrato sobre a percepção dos costumes extintos para uma modernidade que se extinguirá também com seus hábitos de maneiras e linguagens. Tudo contado de forma lúdica e pedagógica por Ana Maria Machado, que faz as meninas mais sensíveis derramarem lágrimas com essa tão envolvente narrativa.

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