“Nada
melhor do que o inusitado para definir ou redefinir o velho.” Este é um excerto
da obra literária Urânios, da autoria de Roberto Muniz Dias, que resultou numa
adaptação teatral intitulada “Uma Cama Quebrada”. O texto aborda um tema
delicado, o qual, poucos exploram com
profundidade esse aspecto do comportamento humano. Falo do poliamor, termo que se
refere ao relacionamento aberto, cujo assunto,
divide opiniões mesmo em mentes mais esclarecidas da sociedade ultramoderna.
Em
“Uma cama Quebrada” vemos, sob a perspectiva de um terceiro integrante, um
relacionamento homoafetivo “supostamente estabilizado” em seu cotidiano onde os
componentes (casal + novo integrante) expõem na dinâmica do lar, suas aptidões,
seus gostos, etc. Todavia, acabam trazendo à tona revelações até então
impensadas. A tentativa de juntar o “amor proteção” e o “amor alimento” assume
contornos outros, que não o esperado por quem adentra nessa modalidade
poligâmica. Seria a busca pelo amor o ideal de todo indivíduo? Amor e sexo
podem ser indissociáveis? Seria o olho da verdade restrito a um único
indivíduo? Muitas são as questões que o intenso texto de Roberto Muniz Dias
incita e a acuidade, a exploração que atinge o âmago dos desejos responde a
maioria delas. Fator primordial, sobretudo a juventude que tende a não procurar
informações sobre o que pode implicar a inserção nos relacionamentos e suas
modalidades.
O
drama intercala a rotina do casal (em terceto) com um monólogo em que o
personagem principal dialoga com um quadro de um galo colorido, feito a pedido
de um de seus pares. O outro “amor?” pedira que pintasse um poema de sua
autoria. Essa atitude estabelece um abalo à harmonia do casal, pelo fato do “outro”,
que pediu a pintura do galo, desconhecer o fato daquele gostar de escrever. É
traço marcante da escritura de Roberto Muniz Dias a busca pela essência das
sensações, dos desejos que por vezes resvalam em ecos da tradição, que inscreve
no presente o significado de cada coisa. Por isso o espanto com a ausência de
fotografias do casal. Onde estariam às lembranças da vida conjugal, as viagens,
comemorações? Seriam eles um casal “feliz”?
Sua inserção naquela relação visava realmente o quê? Seria aquele casal, agora
em terceto, a representação de uma relação já fadada ao fracasso?
Uma
Cama Quebrada, tem o mérito de abarcar de modo autêntico e ousado as questões
que muitos tocam apenas superficialmente. A encenação, expõe ali, aos olhos da
plateia um retrato fiel da contemporaneidade em sua busca da resposta a seus
anseios amorosos, ou seria suas carências? Mesmo que para isso, tenha que contrariar
as regras estabelecidas, as convenções ou o que pode ser mais pungente, quando
a própria identidade individual encontra-se esfacelada em decorrência das
desilusões.
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