Pitty: entre dramas pessoais e crítica social |
A presença feminina mais significativa do rock
nacional está de volta. Após dedicar-se ao projeto paralelo Agridoce, Pitty
reaparece mais roqueira do que nunca e coloca no mercado seu mais novo trabalho,
intitulado Setevidas. Esqueça os refrões pegajosos de músicas como Máscara,
Memórias ou Me Adora, ao que parece a única música nova aspirante a hit é Setevidas, primeiro single do álbum homônimo.
Essa faixa, serve também como síntese desse trabalho, que tematiza principalmente a superação, o ressurgimento,
a insistência ou mesmo a eterna busca por um sentido de existir, em meio a tantas
formas de preencher cada segundo de nossas vidas, nós reles mortais. Nessa nova
empreitada, a cantora finca o pé no rock pesado, mas lança mão de novos
elementos como um piano, coro de vozes e até instrumentos como agogô e caxixi,
até então novidades ao som de Pitty e sua banda.
Se rock é sinônimo de atitude, com
Pitty não é diferente, suas músicas são cheias de críticas sociais, na faixa Boca
Aberta a cantora dispara: Êta alma buraco sem fundo/ Que se vive tentando preencher/
Com deuses com terapia/ Cartão de crédito academia/ Um trago, carros velozes...,
e como atesta no decorrer da letra, quanto mais se deixa consumir, mais se é
consumido por uma iminente frustração: Amanhã acordo resmungo/ Eu quero minha
vida de volta. Essa simplicidade de cantar a explícita “experiência humana de
nossos dias” ganha reforço e contornos metafóricos em A massa, a mesma massa
refém do consumismo desenfreado, alheia a uma contemplação, ou ainda a um
contentamento da própria existência em
si. A massa, cantada por Pitty, é modelada e nem se dá conta que quem os molda
é quem sai ganhando mais e mais: “a massa é feita pra saciar a fome dos que a sabem
modelar”. Mais uma faixa análoga à situação da população brasileira, que de uma
forma ou de outra, sucumbe ao sistema político vigente, obedecendo a falsas
ideologias. Um exemplo disso é o próprio termo “popular”. Explico: o indivíduo
de classe baixa, adquire à duras penas, com muito suor, pagando por cinco, seis
anos um carro popular. Entendo o Criolo: que “popular” é esse? Pitty com ironia
e primazia reafirma essa situação pela qual “a massa” alienada passa.
Além da verve crítica, Pitty também
embala dramas pessoais em Setevidas, Lado de Lá, por exemplo, refere-se a morte
de um antigo membro de sua banda: Peú Souza. É nessa faixa que aparece um
eficiente uso do piano e o coro de vozes entoando “guarde pra mim um bom lugar”
e dá-lhe rock psicodélico. A faixa que fecha o álbum, Serpente, adere aos
instrumentos de percussão que citei no início: agogô e caxixi. Tem um coro
também que evoca “The perfect Life” do Moby. Encaixaria muito bem ao projeto
Agridoce. Seria sobra de estúdio? Especulações à parte, o fato é que a faixa finaliza,
com a calma almejada, o percurso que Setevidas tematiza: o ressurgimento, a
volta por cima, ou nas palavras de Pitty: sua postura combativa. Pitty pode não
agradar aos fãs que esperavam as músicas grudentas de outrora, porém ganha os
aplausos daqueles que apreciam um som autoral, sem pretensões de cair no gosto
dos fãs ou críticos especializados.
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