A obra em sua 2° edição |
Marcelino
Freire é um dos escritores mais notáveis da atualidade. Vencedor de prêmio
Jabuti; organizador da balada literária; dono de um estilo o qual alguns chamam
de “transgressor”, enfim, tendo em vista a obra Amar é crime, torna-se notório
a importância de sua escrita no cenário da literatura brasileira, uma vez que
sua obra agrupa-se, devido à temática, ora à literatura queer, ora à literatura de denúncia social, ou ambas citadas.
A
marginalidade, o abjeto, o profano, são matéria prima farta na prosa freiriana.
Marcelino traz a voz das periferias das grandes cidades. Locus “preferido” dos
crimes sejam passionais, ou de outra ordem. O conto “crime” se encarrega disso,
aliás, bem mais que isso: a personagem desse texto relata à mãe um plano
mirabolante para se vingar da namorada. Num ritmo frenético, onde discorre
sobre as atrocidades que faria com a refém, sua namorada, o plano vai se
tornando cada vez mais ambicioso à medida que a visibilidade deste aumenta, ou
seja, com a chegada de vizinhos, parentes e finalmente, tomando conta dos
principais noticiários do país: “(...) mãe, eu vou ficar famoso, vem o SBT, a Record,
a Rede Globo, a polícia no meio do esgoto, no megafone, me chamando, Roni,
Roni, Roni, rá, aqui é o capitão...” (p.57) Lançando mão da oralidade,
característica da prosa freiriana, “Crime” abarca o aspecto provocativo de Marcelino,
seja visando os aspectos linguísticos, oralidade, humor corrosivo, etc, seja
pelo enredo surpreender: no referido conto a personagem decide expor, a partir
do seu crime a calamidade na qual se encontram os marginalizados pela
sociedade: “ (...) eu vou aproveitar todo o acontecimento pra falar da
sacanagem, da falta de educação, de saneamento, do desmoronamento, da chuva
quando vem e molha e engole o povo... eu quero que o governador apareça,...” (p.57)
No entanto, a imprevisibilidade narrativa, outra marca de Marcelino, ainda
reserva “sarcásticas” surpresas ao final de “Crime”, é ler pra amar, digo pra
crê.
As
personagens de Amar é crime são, em sua maioria, o negro marginalizado, o
homossexual, a travesti, a garota de programa, etc. A ritmada prosa freiriana, encarrega-se
de dar a voz aqueles a quem a sociedade (outrora?) deu as costas. Por isso a urgência em
que são apresentadas; devido à opressão, os sentimentos são defendidos com
unhas e dentes, posto que “amar” não chega ao entendimento de muitos, o que
acarreta no combate: o crime, a desordem, posto que amar é superar as mazelas
do próprio indivíduo, da mesquinhez humana. Aliás, esses textos acabam por soar
irônicos: como amar em meio ao caos dos nossos dias? Amar é crime, configura um
fiel retrato do nosso conturbado tempo. Mas nem tudo está perdido, é preciso
olhar para as margens, para aqueles que buscam o mínimo que uma vida digna
possa oferecer. Eis, em Amar é crime, uma literatura não só de entretenimento,
mas de denúncia e quiçá, de esperança.
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